OUTRAS CRENÇAS
A galinha do Coadouro
Clara Perdiz, de Mação, apresentou, na Exposição HISTÓRIAS E LENDAS DE MAÇÃO, que esteve patente ao público na Galeria da CMM em Outubro de 2019, um
quadro representando uma galinha conduzindo a sua prole de 6 pintainhos.
Esta pintura ilustrava a “Lenda da Galinha Clara”, que a própria expositora descrevia numa legenda à parte.
Quando eu era pequena, o meu avô Tomaz, que era marchante e tinha como transporte um possante macho, andava de terra em terra a comprar gado, azeite e cereais para abastecer a sua loja, onde vendia esses produtos.
Corria as estradas e caminhos do Concelho de Mação e, ao chegar à ponte do Coadouro, aquela que fica a caminho do Penhascoso, o macho estancava e não havia nada que o fizesse seguir.
O meu avô bem puxava pelas rédeas, mas nada! O macho não se mexia até que uma galinha saía das ervas e, com os seus pintos, atravessava a estrada. Só depois é que o macho voltava a andar.
Esta “cerimónia” repetia-se sempre que o meu avô passava pelo Coadouro.
Então não havia dúvidas: Isto, ou eram almas do outro mundo ou então era alguma bruxa que se transformava em galinha.
Era sempre um susto, com muito respeito.
E assim contava Clara Perdiz e se formou a “lenda da galinha clara”.
Mas esta ponte, como todas as pontes antigas (sobre ela teria passado a via romana que ligava Conimbriga a Emérita Augusta, em Espanha), esteve sempre envolvida em variadas crenças, dizendo-se, em tempos remotos, no Penhascoso:
Entre Bandos e Rebandos
e os dois Caratões ambos
e a Serra da Feiteira
e a Ponte do Coadouro
há uma mina de ouro.
Quem n’a encontrar
sete anos de vida há-de lograr.
Por quase todo o Concelho de Mação teria havido, na antiguidade, extracção de ouro de aluvião nas várias ribeiras e também em filões de minas e poços, ao qual o povo chamava ouro arraiado e que, no seu imaginário era tão abundante que “chegava ao ferro do arado”.
FONTE
- EXPOSIÇÃO “Histórias e Lendas de Mação”, 2019 - Clara Perdiz.
- MEMÓRIAS DAS PONTES, Teresa Aparício, pag. 097
A pomba do Vale Longe
Uma família de Mação, constituída por pai, mãe e filha possuía uma horta, cercada por densos pinhais, no sítio denominado Vale Longe, um vale profundo e misterioso situado muito perto da Vila.
Um dia, a mãe faleceu e, sempre que a filha se encontrava na horta, uma pomba negra saía do pinhal e punha-se a esvoaçar à sua volta, até que desaparecia por entre os pinheiros, dando gemidos.
A rapariga assustava-se mas não dizia a ninguém o que estava a acontecer e um dia, a pomba veio pousar na cesta que já estava pronta com as hortaliças para consumo da casa.
Então, ganhou coragem e interpelou a pomba, enquanto se benzia:
— Se és alma do outro Mundo, dize o que queres, mas se és demónio arrenego de ti em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo!
E logo a pomba lhe respondeu:
— Sou a alma da tua mãe e não posso entrar no Céu porque ela não cumpriu uma promessa de mandar dizer uma missa ao Divino Espírito Santo na sua Capela. Por isso, imploro-te que mandes dizer essa missa para ela poder gozar da bem-aventurança eterna.
A filha correu a contar ao pai o que se passou e este mandou de imediato dizer essa missa na Capela do Espírito Santo.
Estava a missa quase a terminar quando a filha viu a mesma pomba que lhe aparecia no pinhal a entrar na Capela e a esvoaçar em volta do altar.
Finda a missa, a pomba escura transformou-se numa pomba branca como a neve, poisou no seu colo, beijou-a, levantou voo e sumiu-se pelos ares fora.
A pomba branca era a alma da mãe que, agradecida, a beijava e agora, já livre de encargos, ia ver a face de Deus.
FONTES
- EXPOSIÇÃO “Histórias e Lendas de Mação”, Fernanda Gaspar
- ELEMENTOS HISTÓRICOS E ETNOGRÁFICOS, SERRANO, Francisco, Câmara Municipal de Mação, 1998.
A grade do Poço Mourão
Antigamente, as gentes da Amêndoa acreditavam que todo aquele que tivesse o mesmo sonho três vezes seguidas teria de se apresentar à meia-noite junto do Poço Mourão e, nessa altura, veria uma junta de bois emergir das águas arrastando para fora do poço uma grande grade de ouro.
Um dia, um homem, feirante de profissão e tendo sonhado 3 vezes seguidas com o mesmo acontecimento, embora incrédulo, quis cumprir a crença e, à meia-noite, apareceu junto do Poço Mourão.
Um pouco depois de ter chegado viu uma junta de bois sair da água a puxar uma enorme grade de ouro e logo se apressou a ajudá-los a saírem do poço e, tão contente estava com a aparição, disse:
– Deus queira ou Deus não queira, a grade de ouro há-de ir à feira.
Dito isto, viu a junta de bois recuar e logo a grade de ouro desapareceu, afundando-se no poço.
E o povo diz que foi Deus que o castigou; não tivesse sido avarento.
Hoje, ainda há quem diga na Amêndoa:
– Quem for à meia-noite ao Poço Mourão, na véspera de S. João, ainda ouvirá as campainhas que os bois traziam ao pescoço.
FONTE
- EXPOSIÇÃO “Histórias e Lendas de Mação”, Maria Timóteo
A rendeira da Serra da Galega
Há muitos anos atrás, uma rendeira que morava na Aldeia Galega, no Carvoeiro, sofria todos os tipos de maus-tratos do seu marido, quando este chegava a casa completamente embriagado.
Quando isso sucedia a mulher pegava numa candeia de azeite, na sua renda e ia refugiar-se numa espécie de gruta existente na Serra da Galega.
Passava a noite a fazer renda á luz da candeia e, nas noites frias, acendia uma fogueira na entrada da gruta, não só para se aquecer, mas também para se proteger dalgum lobo mau que por ali aparecesse, pois nesse tempo viam-se lobos com frequência naquela serra.E estas idas à gruta sempre existiram enquanto a desventurada rendeira foi viva, mas após a sua morte, em certas noites, os habitantes da Aldeia viam a luz de uma candeia à porta da gruta, ao lado de uma sombra sentada a fazer renda.
FONTE:
- EXPOSIÇÃO “Histórias e Lendas de Mação”, Maria de Lurdes Freitas, Lenda e pintura em acrílico sobre tela 40 x 30
Fonte dos meus amores
Quem, no Penhascoso, se dirigir à Capela de Santo António e cortar à direita vai encontrar uma fonte conhecida por Fonte Velha. Mas há quem lhe chame também a “Fonte dos Meus Amores” e isto, provavelmente, porque foi ali que as nossas mães e avós, nas tardinhas de domingo, viveram deliciosas, mas ingénuas, sessões de namoro.
É essa fonte que Maria José Marques representa nesta pintura que, na EXPOSIÇÃO “Histórias e Lendas de Mação”, fez acompanhar do seguinte poema:
Ó Fonte chamam-te Velha
por não te verem às cores.
Deviam era chamar-te
a Fonte dos Meus Amores.
Penhascoso já contaste
os cântaros aqui quebrados?
E quantos dos teus casamentos
foram aqui combinados?
Diz-se que pela tardinha,
em dias de sol escaldante
se enchia a cantarinha.
Rapazes de olhar galante
esperavam dando a voltinha,
fingindo um olhar distante.
FONTE:
- EXPOSIÇÃO “Histórias e Lendas de Mação”, Maria José Marques
Gatos-pantufas
Na Exposição da Escola de Pintura de Mação, denominada “Histórias e Lendas de Mação”, Maria de Jesus Magalhães expunha um curioso e inspirado quadro a óleo da sua autoria, a par do qual nos contava:
Os gatos-pantufas saem à noite
disfarçados de fantasmas,
andando pelas ruas
para protegerem as pessoas
dos espíritos maus.
FONTE
- EXPOSIÇÃO “Histórias e Lendas e Mação” – Maria de Jesus Magalhães
Cavalo branco
Na saída da auto-estrada A-23 para o nó da Ortiga começa a estrada EN 3-12 com direcção a Mação, lugar que é conhecido por Charneca.
Ora, na EXPOSIÇÃO “Histórias e Lendas de Mação”, contava Rosalina Carias que alguns maçaenses, incluindo um tio seu, afirmavam que, a horas adiantadas da noite, aparecia ali um garboso cavalo branco que galopava a par dos carros e bicicletas que se dirigiam à Vila.
O cavalo aparecia num determinado sítio e desaparecia logo de seguida, um pouco mais à frente. O acompanhamento era de curta duração e o animal limitava-se a correr, como se disputasse uma corrida.
Modernamente, essa inofensiva visita do cavalo branco da Charneca não mais ocorreu, razão pela qual esta crença tem estado a cair no esquecimento.
FONTE:
- EXPOSIÇÃO “Histórias e Lendas de Mação”, Rosalina Carias
Paixões entre margens
Diz o povo da Ortiga que, noutros tempos, era frequente existirem paixões entre pessoas de ambas as margens do Tejo.
Das várias histórias contadas a propósito, Maria José Marques pintou um quadro que expôs na Exposição “Histórias e Lendas de Mação” a par do qual nos relatou um desses curiosos casos que se crê terem sido “vividos entre margens”.
Foi nas terras da Ortiga que um jovem cavaleiro se deixou encantar por uma bela mulher da outra banda do Tejo mas que, infelizmente, só avistava de vez em quando por não dispor de meio para se aproximar-se dela.
Então, movido por enorme paixão, dirigiu-se a quem o podia ajudar nos seguintes termos:
Ó barqueiro traz-me a barca,
que o Tejo quero passar.
Saudades da minha amada
já me estão a transtornar.
Suas tranças cor de ouro
fazem sonhar noite e dia.
Todo o seu encantamento
reflecte a nostalgia.
Fico noites sem dormir
nestes bosques que aqui vês.
Tejo, guarda as minhas lágrimas
sem me mostrares altivez.
Então o barqueiro, que também já tinha passado por paixões idênticas, passou a ajudar o cavaleiro neste seu grande romance de amor.
Fonte:
- EXPOSIÇÃO “Histórias e Lendas de Mação”, Maria José Marques
Trovoada no Penhascoso
A propósito do ditado popular “Só te lembras de Santa Bárbara quando faz trovoada”, dizem os mais antigos do Penhascoso que, em noites de tempestade, se as pessoas estavam a comer, paravam imediatamente ao ribombar do trovão e cantavam:
Onde vais S. Gregório
com teus sapatinhos às costas.
Vai espalhar as trovoadas
Por onde não haja
nem eira nem beira,
nem mulheres com filhos,
nem vacas com bezerrinhos.
Santa Bárbara, Santa Bárbara, Santa Bárbara.
FONTE
- À Descoberta da Freguesia do Penhascoso – 5.7 Lendas e Superstições, A simbologia das cores para os mouros, pag 133
A Cascata do Chorro
No site RESPIRA NATUREZA, Rui Santos (Gady) mostra-nos uma bela fotografia da Cascata do Chorro, uma queda de água que faz parte da Ribeira do Caratão e que, neste local, se esconde, terra adentro, para não mais ser vista nas proximidades.
Dizem lendas antigas que esta Cascata corre por debaixo do solo até ao Pego da Moura, poço que fica situado entre as Casas da Ribeira e a ponte do Castelo, muito próximo da Buraca da Moura.
FONTE
O ouro do Caratão
A aldeia do Caratão é muito rica em lendas e crenças relacionadas com o oiro.
Provavelmente a mais popular, aliás muito conhecida em Mação, reza assim:
"Entre Bandos e rebandos
e os dois Caratões ambos
e a Rua da Amieira
e o penedo do Aivado
há oiro arraiado,
que chega ao ferro do arado".
Dizem os arqueólogos que estes versos populares anónimos explicam, de certo modo, o povoamento antigo do cabeço quartzítico chamado hoje Castelo Velho do Caratão, situado a nordeste de Mação, entre as Ribeiras do Aziral e do Caratão.
Uma outra versão, mas esta dedicada à própria Vila de Mação, também é muito recitada pelo povo:
"Entre Bandos e Rebandos
e os dois Caratões ambos
e a ponte do Cadouro
há um mineral de ouro"
Fonte
O “medo” da Caldeirinha
Diz Manuel de Jesus Gueifão, de Casas da Ribeira, que há muitos anos, aparecia nas encruzilhadas desta sua aldeia um fantasma a que o povo chamava “o Medo da Caldeirinha”.
As pessoas viviam apavoradas e já quase ninguém saía à rua logo que a noite começava, com excepção do José Branco, que tinha fama de não ter medo de nada e que dizia alto e bom-som:
— Esse fantasma que venha, que lhe dou uma trancada!
Cansados de ouvir tal coisa e para testarem a coragem do José Branco alguns dos seus amigos decidiram pregar-lhe uma partida.
Então, numa bela noite, juntaram-se no cruzamento da Rua da Igreja com a Rua Principal e prepararam a cena que iria testar a coragem do amigo.
Um deles cobriu-se com um lençol branco e, segurando uma caldeira com pez a arder, pôs-se a meio da encruzilhada.
Não foi preciso esperar muito, pois passado pouco tempo lá apareceu o José Branco que, ao deparar com aquela hedionda figura, mal iluminada pelo fogo do pez, não se amedrontou e logo começou a apanhar do chão quantas pedras podia, sem nunca perder de vista a alma penada.
E, com quanta força tinha, pôs-se a atirar contra a aventesma uma saraivada de pedras, ao mesmo tempo que dizia:
— Não sei se és homem ou fantasma, mas qualquer que sejas vais corrido à pedrada!
O amigo disfarçado de Medo, vendo o caso mal parado pôs-se aos gritos de braços levantados:
— Eh, pára lá com isso! Sou eu, o teu amigo João. Como dizes que não tens medo de nada, nem das almas penadas, decidimos pôr-te à prova.
O José Branco achou graça à brincadeira por poder provar que era mesmo valente e que os fantasmas, afinal, são gente bem-disposta.
Fonte:
- O JORNALINHO CASAS DA RIBEIRA - MAÇÃO http://www.areopago.com.pt Nº 4 • Outubro 2007, pág. 7 História contada por Manuel de Jesus Gueifão
O “medo” do Pereiro
Diz Maria de Jesus Pereira, de Mação, que o Luiz Manuel, do Pereiro, tem sido muito atentado com situações pouco naturais que podem considerar-se mesmo fantasmagóricas.
O Luiz tinha o costume de ir jogar as cartas a casa de um senhor que tinha vindo do Brasil que era seu vizinho e, por vezes, vinha tarde, para lá da meia-noite.
Quando isso sucedia uma gaiata sua, que ainda era muito pequena e tinha medo da noite, desatava num choro que não conseguia conter e que só parava depois do pai estar em casa.
Numa dessas noitadas, vinha o Luiz Manuel a chegar a casa viu assim como se fosse um vulto. Não conseguiu distinguir se era pessoa e de quem se tratava porque, nessa altura, não havia ainda iluminação pública no Pereiro, mas teve a sensação de que aquela figura tinha qualquer coisa de sinistro.
Entrou em casa e, daí a nada, ouviu os chibos a berrarem porque o palheiro dos animais era logo ali em frente ao pé da janela.
Incomodado, dirigiu-se à porta, enquanto bradava:
— Rai’s parta os chibos, que não se calam de berrar…! O que é que se passa?
Mal abriu a porta viu um vulto enorme, que lhe pareceu o mesmo da outra noite.
Pegou numa pedra e atirou-a com quanta força tinha àquela coisa sinistra. A pedra não lhe acertou, mas o vulto logo desapareceu a coberto da escuridão.
E então, a situação tornou-se alarmante: queria fechar a porta, mas não conseguia porque do lado de fora parecia que alguém empurrava e a porta não fechava. Por outro lado as cabras continuavam a berrar cada vez mais e, não bastando, a cachopa sua filha, chorava, chorava, sem parar e “aquilo” ficava a bater na porta até quase de manhã cedo, toma, toma, toma, na porta.
O Luiz, desesperado, foi ao benzilhão e à bruxa várias vezes, mas a situação, de vez em quando, repetia-se.
Ele vivia muito atentado com aquilo e a cachopa só conseguia sossegar lá pelas 4 da manhã e estava magrinha, magrinha com tanto chorar e os videntes continuavam a dizer:
— Foi pior ter aventado a pedra atrás daquilo.
FONTE
Crenças do Vale das Aldeias
Chamam Vale das Aldeias à planície mais ampla e aberta do Concelho de Mação, que integra as povoações de Monte Penedo, Ribeira de Boas Eiras e Espinheiros.
É um vale muito fértil com cerca de 70 hectares que é atravessado, sensivelmente a meio, pela Ribeira de Boas Eiras.
O Museu de Mação defende, fundamentado nas escavações que efectuou no local, que foi neste vale que se fixou um dos primeiros núcleos de habitantes de Mação, que poderão ter sido enterrados numa anta próxima, a da Foz do Rio Frio.
Ora, gente tão antiga criou, tal como as restantes aldeias da nossa Região nos tempos modernos, as suas crenças e superstições e algumas delas conseguiram perdurar até aos nossos dias.
Uma dessas lendas que chegou até nós é a do Pego da Surraipa, que diz ter existido, a partir desse poço, um túnel que terminava na Cova dos Mouros, local que fica próximo da Ribeira do Rio Frio e onde residia, com sua família, uma formosa moura.
Ora, a bela moura tinha encantado um jovem cristão que a visitava regularmente e que, para não ser visto, sempre utilizava esse túnel. E assim os jovens amantes podiam trocar as suas juras de amor fora dos olhares curiosos que, por certo, reprovariam o doce enlevo entre dois entes de religiões e costumes tão diferentes.
Uma outra lenda que se conta em Monte Penedo é a da Portela das Armadas, local onde actualmente existe o túnel da A-23, no velho caminho que vai de Monte Penedo à Ortiga.
Aquela denominação terá sido adoptada pelo facto de ali os nossos soldados terem feito frente às tropas estrangeiras, quando das invasões francesas.
Outra crença que tem perdurado no Vale das Aldeias ao longo dos tempos é a de que havia um padre que, depois de ter morrido, aparecia às pessoas que passavam nas proximidades do Casal da Quinta.
Neste local, ainda existem ruinas de uma habitação onde esse padre terá residido e onde são visíveis até agora os restos de um nicho com a imagem de um santo.
Existe também num dos pilares de uma nora, que fica junto do açude construído na Ribeira de Boas Eiras, um símbolo gravado na pedra que parece tratar-se de um pentagrama invertido.
Este símbolo – uma estrela de cinco pontas com uma delas voltada para baixo – é com frequência associado às práticas ocultas e rituais satânicos, tendo em vista afastar os “maus-olhados” e atrair estados de ventura.
Não se encontra justificação para o facto de este pentagrama ter sido gravado num dos pilares da nora. Porquê ali, a meio da horta? Seria para poupar o burro de maus- olhados para que ele fizesse todas as voltinhas, feliz e em segurança, até esgotar a água do poço?
FONTE:
- AMMPRBEE – MEMÓRIAS DAS ALDEIAS – 30 mil anos de povos e de vivências várias, pag. 56
O lobão dos Bandos
Entre os pastores da aldeia de Santos dizia-se que o
maior lobo das Serras dos Bandos ia, todos os dias, beber água ao Casal dos Brejos, porque aquela água o tinha curado de um envenenamento provocado por uma armadilha em que tinha caído.
Este corpulento lobo era apelidado de “Lobão” por ser a maior fera existente na região e um autêntico Rei dos Predadores, pois a sua matilha já tinha eliminado algumas dezenas de ovelhas, cabras e cabritos.
Era preciso, portanto, capturá-lo e eliminá-lo para que as pastagens se pudessem fazer em sossego.
Então, foi escolhido o mais velho dos pastores, o Zé de Aldeia de Eiras, para, com mais 3 pastores, se certificarem sobre os hábitos do Lobão a fim de se elaborar um plano para caçar o bicho.
E o grupo, chefiado pelo Zé, era constituído por mais um pastor dos altos do Castelo, outro dos Santos e um terceiro do Caratão.
No primeiro dia, encontraram-se depois do Sol-posto e levavam uma arma de fogo, um cajado com moca ferrada e uma faca de mato. Nada de cães.
Então, subiram o monte e chegaram às vistas da represa dos Brejos, que era onde os bichos iam beber e, de ouvido alerta, espreitavam as redondezas, mas nada se mexeu durante toda a noite e até ao romper da manhã.
Na segunda noite de vigília ouviram uivos ao longe, para os lados do Vale do Grou e, a meio da noite, um casal de raposas andou por ali, envolvido em derriços o que levou o Zé a observar que se andavam tão à vontade era sinal de que não havia feras por próximo.
A terceira vigília foi diferente. Não longe do sítio em que se encontravam ouviram uivos e, uma hora depois, desciam dois lobos de orelhas arrebitadas e andar cauteloso e dirigiram-se à represa.
Beberam uma barrigada de água e, logo a seguir, aparece o Lobão com aspecto imponente, dum tamanho descomunal e uma bocarra de meter medo. Nunca os pastores tinham visto uma fera tão corpulenta.
Parou a poucos metros da represa, bebeu por várias vezes até se sentir saciado e deitou-se.
Vinham com ele mais dois lobos, que se deitaram a seu lado, e o Zé não teve dúvidas:
— Os dois primeiros servem-lhe de batedores e de provadores de água e os outros dois de protecção para não cair em esparrelas.
Horas depois, o Lobão ergueu-se, uivou prolongadamente e iniciou a marcha de volta, dois lobos à sua frente e outros dois atrás de si, parecendo uma patrulha da tropa. Bem protegido, portanto.
Seguiram monte acima para o seu refúgio, algures, nos altos das penedias do cume dos Bandos, provavelmente nos penedos do Coxo.
Estava agora bem definido o caminho de aproximação à represa dos Brejos destes bichos, portanto, poderia ser organizada, com a segurança suficiente uma próxima batida para acabar com o corpulento Lobão, destruidor de rebanhos.
Entretanto, durante as três longas vigílias em que os quatro pastores se ocuparam, o Zé de Aldeia de Eiras contou que a propósito do ambiente místico criado à volta de lobos e alcateias nasceram histórias que os mais velhos da aldeia contavam ao serão junto à lareira.
Uma dessas crenças reza que, há muito tempo atrás, viveu um homem largos anos entre as feras que, um dia, o encontraram caído na serra, bêbedo e sem sentidos.
Os lobos levaram o pobre infeliz para a sua gruta e ali lhe lamberam e curaram as feridas e o homem viveu muito tempo entre eles e acabou por entender a “linguagem” das feras e também conseguiu fazer-se entender pelos bichos.
Quando o homem restabeleceu as forças e decidiu ir-se embora, foi impedido pelos lobos, que lhe esconderam a roupa e o obrigaram a ficar na gruta.
Só mais tarde, na confusão de uma batida, é que ele conseguiu fugir.
Mas, ao contar a sua história, acabava sempre por se mostrar arrependido, afirmando:
— Sentia-me melhor no meio dos lobos do que aqui, no meio dos homens!
FONTE
- HISTÓRIAS DE GENTE SIMPLES, Prof. José Marques Valente, O Lobão dos Bandos, pág. 513
O Castelo Velho do Caratão
Sabe-se, ou melhor, estão convictos os arqueólogos, que se têm dedicado aos estudos das culturas e das sociedades antigas na nossa região, desde o Dr. Calado Rodrigues até aos actuais cientistas do nosso Museu de Arte Pré-Histórica e do Sagrado do Vale do Tejo, que a vida de comunidade em Mação nasceu no local daquele a que, hoje, chamamos o Castelo Velho do Caratão.
Foi em 1946 que o Dr. Calado Rodrigues, influenciado por lendas e pelo topónimo “Castelo Velho” identificou este “monumento” como um castro que data do fim da época do bronze, cerca de 1.000 anos aC
E foram os artefactos encontrados no local e também as marcas deixadas na sua área envolvente, resultantes de uma acentuada actividade metalúrgica, e não só, que levaram os estudiosos da altura a acreditarem que ali existiu um povoado, que teria sido o primeiro a erguer-se no
território hoje ocupado pelo concelho de Mação. E que esse povoado se instalou, estrategicamente, no cimo dum monte, com boas defesas naturais e com terrenos férteis nas suas imediações, bem regados pelas ribeiras do Aziral, do Caratão e de Eiras e com boas potencialidades para a prática da agricultura, da pastorícia e da pesca.
Sabe-se, portanto, que Mação nasceu ali, mas há grandes dúvidas sobre a altura em que o local foi abandonado e qual a razão do despovoamento.
Os cientistas têm dúvidas, mas há quem não tenha.
Na EXPOSIÇÃO “Histórias e Lendas de Mação” de 2019, Florinda Magalhães apresentou um quadro da sua autoria, com a seguinte legenda:
Há muitos anos, numa floresta perto de Mação, um Castelo foi atacado por lobisomens, tendo a população fugido e o Castelo destruído.
Hoje, encontram-se apenas ruinas.
Fica-se, então, a saber que o povoado desapareceu porque as pessoas, cheias de medo, fugiram dos lobisomens?
Seria?
FONTES:
- EXPOSIÇÃO “Histórias e Lendas de Mação” – Florinda Magalhães
- ARKEOS 41 – O CASTELO VELHO DO CARATÃO E A PROTO-HISTÓRIA DE MAÇÃO.
- MONUMENTOS HISTÓRICOS DO CONCELHO DE MAÇÃO, Maria Amélia Horta Pereira, pag.102
A donzela da Bichieira
Passeava uma linda donzela perto do Ribeiro da Bichieira, zona de caça que existia perto de Cardigos, quando deparou com um moço de aspecto humilde mas de muito boa figura, batedor de um dos cavaleiros que por ali caçava, e logo dele se apaixonou.
Embevecida pela felicidade do encontro, correu a casa a anunciar a seu pai que tinha encontrado aquele com quem queria casar.
Embora a escolha de sua filha tivesse recaído num simples pajem sem fortuna, o pai aceitou a opção, dado que era bastante rico e nada ganancioso, e mandou chamar o moço.
Só que o pretendido noivo não quis aceitar, apesar de lhe ser oferecido um avultado dote, dado que tinha feito a promessa solene de continuar eternamente livre.
Mas a donzela não desistia do seu intento e entrou em grande alvoroço, pedindo ao pai que obrigasse o moço a aceitá-la, pois esse era o seu intenso desejo.
Entretanto, o rapaz, também muito determinado e em angustiosa desesperança, fugiu dali correndo com os criados do pai da donzela sempre atrás dele, até que, sentindo-se encurralado, se encostou a uma azinheira e, mesmo ali, cravou um punhal no peito e caiu no chão sem vida.
Foi sepultado nesse mesmo local, à beira da azinheira e, porque se tratou de um caso raro, o lugar passou a ser piedosamente visitado por muitas gentes dos arredores que, entretanto, foram-se estabelecendo por ali, surgindo nesse sítio a Aldeia do Azinhal.
A bela jovem, arrependida do pedido que fez a seu pai e que resultou de tão macabro acontecimento, nunca mais saiu de casa, passando a ocupar todo o seu tempo a tecer lindas toalhas de linho.
Fonte:
- César di Ambaca, HISTÓRIAS E LENDAS DE CÁ, pág. 5
O tesouro da Ribeira do Maxial
Contam os antigos que, noutros tempos, as pessoas guardavam as suas riquezas em minas debaixo do chão.
É o caso do tesouro da Ribeira do Maxial, na zona de Pracana da Ribeira em Cardigos que, segundo o que se dizia, “era constituído por uma mina de ouro, muito rica e colossal, que ficava junto da Ribeira”.
Vem ainda dos antigos a certeza de que
— Quem sonhasse três vezes com este tesouro, sem nada contar, poderia alcançar essa riqueza, mas atenção, quem tivesse a coragem de tentar a entrada na mina seria assaltado de um medo que poderia matar quem dela se aproximasse.
Até hoje não há notícia de que alguém se tenha atrevido a descer a essa mina, por terem tanto medo e crerem em superstições, mas ainda se houve dizer em Cardigos:
“Entre bandos e rebanhos
E a Ribeira do Maxial
Está lá uma mina de ouro,
Que pode governar Portugal.»
FONTE:
- Elvira de Jesus, Santa Casa da Misericórdia de Cardigos.