1 - BURACA DA MOURA DA COVA DAS ALMAS
Sobranceira ao estreito e serpenteado Ribeiro dos Lavadouros, na encosta da ingreme da chamada COVA DAS ALMAS, existia, dizia a lenda, uma gruta debaixo de uma enorme pedra, que dava mostras de ter seguimento para o interior do monte, onde outrora vivera uma Moura Encantada, descendente dos povos mouriscos que por aqui existiram.
Fugida dos ataques das Forças Cristãs na sua passagem para o sul, a dita Moura aqui encontrou um local para morar.
Reza a lenda, que certo dia que enquanto pastava o seu gado junto ao ribeiro, uma pequena pastorinha viu a Moura, junto a um grande estendal de roupa, a pentear a sua reluzente cabeleira cor de azevinho, com um pente que cintilava ao sol.
Era de ouro – Pensou a pequena camponesa.
A Moura ao ver a pequena pastorinha, chamou-a.
- O que gostas mais? Do meu pente de ouro, do meu estendal de roupa ou dos meus cabelos?
Surpreendida com tão intrigante pergunta, a pastorinha disse que era do Pente de Ouro.
- Foste infeliz no que disseste. Molestaste-me com a tua verdade. Se tivesses dito que era da minha cabeleira, ter-te-ia dado o meu pente e tu e a tua família sairiam da pobreza em que vivem. Assim, as vossas almas irão percorrer para sempre estas covas entre montes.
Dito isto, desapareceu e as almas ainda hoje percorreram aqueles montes, em busca da Moura, daí o nome COVA DAS ALMAS.
2 - OLHEIRO DA GALANTA
Aproximadamente a cerca de 1.000 metros a jusante da Foz da Ribeira de Eiras, existiu outrora uma fonte água de sabor ferroso.
O povo dava-lhe o nome de OLHEIRO DA GALANTA.
Esta fonte foi submersa pela Albufeira da Barragem.
Existia uma lenda sobre esta fonte, que curiosamente era semelhante a outra existente na fonte de ORTIGIA, em Siracusa, na Sicília.
Viveu por estas terras uma linda Mouras que só a ninfas a viam.
Um dia enquanto contemplava a ribeira, um príncipe cristão cavalgando pela montanha abaixo viu a Moura e ficou maravilhado.
Extasiado com a descoberta e cheio de cobiça, tentou raptá-la.
Galanta, se chamava a Moura, gritou por Alah e pelas Ninfas que com ela bailavam no areal da ribeira.
Alah, o seu Deus, não ouviu e a ninfas não acordaram.
Cansada de fugir, desapareceu para sempre aos pés do príncipe, tendo em seu lugar aparecido uma fonte, em que o brotar da água, se assemelham aos soluções da Moura que por ali vivem
3 - O TESOURO DA CHÃ DA MOURA
Dizia-se que neste local existia uma grande panela ou caldeira, que guarda uma grande riqueza em ouro e prata.
Era um local em que o Gado passava muitas vezes e por isso a sua asa foi partida.
Reza a lenda, que aquele tesouro só pode ser encontrado, quando dois homens gémeos lavrarem o terreno onde se encontra. O arado tem de ser feito de todo madeira e em peça inteiriça.
Puxá-lo-á uma junta de bois que sejam gémeos.
4 - OUTEIRO DA MINA
Outrora existente, era um monte que foi artificialmente construído com a terra saída de uma antiga mina romana existente na região.
foi destruído pela eletrificação da Linha Ferroviária da Beira Baixa. Situava nos terrenos a sul da zona industrial de Ortiga.
Reza a lenda que existia por ali um celeiro secreto de algum Burgo Mourisco. Em tempos idos, alguém viu formigas a transportarem bagos de milhos, vindos do seu interior.
Outra lenda aponta que no seu interior existiriam dois enormes potes. Um com ouro e outro com veneno.
Sorte daquele que abrisse o de Ouro e azar do que abrisse o do Veneno.
5 - Um Episódio das Invasões Francesas
As tropas do general Junot, haviam atravessado a fronteira portuguesa na Beira Baixa e, tanto quanto lhes permitiam o estado geral de fadiga dos soldados e as deficientes vias de comunicação, demandavam, Vale do Tejo abaixo, a Capital do Reino.
Uma tarde, nos fins do Outubro de 1807, as primeiras patrulhas, visivelmente estropiadas impondo a sua “força bélica” com uma farda suja, por vezes esfarrapada, e uma espingarda de estrias sem uso, apareceram no alto da Taipa, em Ortiga, pelo caminho que leva à freguesia de Belver.
Nessa ocasião regressava das Torres o velho cirurgião-barbeiro e sangrador, João de Matos Coelho (que aquelas povoações se deslocara para fazer a sua clínica. Não fora molestado pela soldadesca invasora, que havia pressentido, porque cavalgava a corta-mato…pelo Olheiro da Galante, Vale das Estacas, em direcção ao Monte Novo. Mal ali chegou, soube que Ambrósio Vermelho (1 e 2) fora ferido num braço e que reclamava os seus socorros. Foi, então, pela narrativa do ferido inteirado de que este recebera um tiro dos franceses, quando se dirigia pelo caminho, afim de prevenir, contra maus encontros, diversas pessoas do Monte Novo que regressavam da vila (3), onde tinham ido fazer um batizado, visto que as tropas de Napoleão já se encontravam em Ortiga e se preparavam para marchar charneca acima… Levava um papel na mão, e uma garrafa, a fingir que ia à botica aviar uma receita… Mas nem isso lhe valera porque, no Pontão, fora alvejado…
- Mas que aconteceria àquela desgraçada gente se encontrasse os energúmenos dos franceses no meio dos pinhais? Era preciso dar-lhes aviso, custasse o que custasse – gritou o nosso cirurgião…
- Por sorte, andava João Perdiz (4), homem lesto, na apanha do feijão nos Malhadais, o qual, por um mandado do sobredito João de Matos Coelho, seguiu imediatamente, por atalhos furtivos, até ao Brejo, para avisar os do baptisado. Encontrou-os na Volta, por cima do Fojo.
- Inteirados do que se passava, aterrorizados certamente, tomaram, todos, a direcção do Vale da Abelha e, pelos carreiros das encostas escarpadas da Ribeira d’Eiras, conseguiram atingir o Vale das Estacas e pouco depois chegavam sãos e salvos ao Monte Novo…
- Baldados foram, porém, todos os esforços!
- Quando se julgavam livres do encontro dos franceses, vão encontrar-se com eles, precisamente em casa, onde devia realizar-se o jantar do baptizado!
- …um sargento e oito soldados do exército invasor refastelavam-se, ali, levando de vencida os melhores manjares…
(*) Contado ao autor (Joaquim Rosendo), por sua Mãe, Teodora Pires Rosendo
(1) Era trisavô do autor.
(2) Trata-se do bisavô dos ilustres farmacêuticos Mouratos Vermelhos, de Lisboa
(3) Estas pessoas tinham ido a Mação baptisar um menino, Daniel Parente, de que foi padrinho o Daniel de Mação e madrinha a Ana Parentinha, da Ortiga, ao tempo uma beldade disputada pelos principais “morgados” da terra.
(4) Era bisavô do sr. Manuel Perdiz, da Fonte Velha
Transcrição respeitando o texto original, publicado no número único da revista a “Freguesia de Ortiga” em setembro de 1948.
Rui Moleiro